segunda-feira, setembro 24, 2007

Michael Ondaatje II

"Quando alguém fala, ele observa-lhe a boca e não os olhos com as suas cores, a seu ver sempre mutaveis, consoante a luz de uma sala, o momento do dia. As bocas revelam a insegurança ou a presunção ou qualquer outro ponto do espectro do caracter. Para ele são a feição mais complexa de um rosto. Ele nunca sabe ao certo o que uns olhos revelam. Mas consegue descortinar nas bocas uma nuvem de indiferença, uma sugestão de ternura. È facil avaliar erradamente um par de olhos, pela forma como reagem a um simples raio de sol."

In The English Patient





Este livro fala demais sobre mim

Michael Ondaatje

"Kip sai do campo onde andou a cavar, a mão esquerda erguida diante do corpo como se a tivesse magoado.
Passa pelo espantalho da horta de Hana, o crucifixo com latas penduradas e sobe a encosta em direcção à villa. Ampara a mão com a outra, como se resguardasse a chama de uma vela. Hana sai para o terraço, ao seu encontro, e ele pega-lhe na mão e encosta-a à sua. A joaninha que corre em volta da unha do dedo mìnimo passa rapidamente para o pulso dela.
Hana volta para dentro de casa. Agora é ela que leva a mão erguida à sua frente. Atravessa a cozinha e sobe a escada.
O doente vira-se para ela ao ouvi-la entrar. Ela toca-lhe no pé com a mão onde traz a joaninha. O bicho abandona o seu dedo, trocando-o pela pele escura. Evitando o mar de lençòis, inicia a longa caminhada qté ao outro extremo do corpo do doente, mancha vermelho-vivo sobre aquela carne vulcanica."


In The English Patient

Paris

Ja passaram duas semanas. Duas. 2. Ja quis desistir, largar tudo e voltar ao quentinho da minha vida. Ja ocupei o meu espaço numa casa onde não posso ficar mas onde adoro dançar e dormir numa cama grande, onde gosto das manhãs de domingo ao sol. Ja sei fazer umas perguntas nesta lingua redonda, circular, sempre circular e que me cansa, é verdade. Ja comprei dois jornais e uma revista para ir treinando e poder deixar de me cansar tanto. Ja sei que quero ficar, mas que para isso talvez tenha de mudar algumas coisas. Ja pensei em procurar essas coisas que tenho de mudar, uma casa que possa tambem aprender a amar, um trabalho. Ja me deitei na relva, como eles, ao domingo, e também durante a semana, à hora de almoço. Ja conheço mais ou menos este teclado onde o A e o Q estão trocados, onde o til não é muito facil, onde é preciso fazer shift para usar um ponto.
Gosto desta cidade e desta minha vida, apesar das imensas saudades - saudades de pequenas coisas que eram mais do que dado adquirido: estavam tão entranhadas na minha vida que eu nem dava por elas. E agora valorizo. E sinto falta. Não é facil estar longe, mas com o tempo pode ser que este longe se aproxime. De mim, quero eu dizer. Paris

domingo, setembro 09, 2007

Coquette


Em arrumações para a partida - daqui a dois dias - descobri que tenho 33 pares de sapatos.

quinta-feira, setembro 06, 2007

5 Dias

Daqui a cinco dias vou tomar banho, vestir o pijama e adormecer em Paris pela primeira vez. Quando escolhi Paris e me candidatei, nunca imaginei que este dia chegasse tão depressa. E se não pensei noutra coisa senão nisso durante os últimos cinco meses, o que me apetece agora, o que não me sai da cabeça é quem me dera poder voltar atrás e pensar melhor. Não me apetece Paris agora. Não me apetece sair da minha vida, largar tudo e ficar lá sozinha. E por antecipação sinto-me sozinha. Não me apetece. Vai mudar, eu sei que quando chegar lá fico deslumbrada e choro só de pensar em vir-me embora. É assim que funciona, não é? Mas, e agora? Como é que giro as contradições todas? Como é que explico a mim mesma que foi a minha melhor decisão, que vai ser óptimo e que vou adorar, como é que me explico que nada fica para trás e posso sempre voltar à minha Vida? Ou que a minha Vida vai comigo? Que a minha Vida sou eu e os Passos que dou? Porque é assim que as coisas são, não é? As dúvidas ficam pelo caminho, nem chegam a sair do avião, pois não?
Alguém sabe a resposta? Porque o que me parece é que eu sei e digo todas as respostas, não consigo é ouvi-las!
Alguém sabe a resposta?