E ao mesmo tempo que sentia não pertencer a lado nenhum, tinha uma necessidade enorme, incontrolável, de ir desaparecendo dos sítios para ir para outros sítios. Duravam cinco dias a uma semana, estas saídas, e normalmente não avisava e não dava notícias. Porque eram estes afastamentos inexplicados e não reportados que lhe davam a sensação de isolamento. Quando voltava, tudo estava na mesma, menos a sua posição no grupo. Não se sentia só quando lá estava, mas bastavam 3 dias longe para que deixassem de sentir a sua falta. E isso era assim em todo o lado, mesmo nos esconderijos. Mesmo em casa. E não é que sofresse, já era um hábito, mas se pensasse nisso, se durante uma insónia se pusesse a pensar nisso, sabia que sofria. Só podia sofrer, ninguém aguenta sentir-se dispensável. Mas continuava a fazer tudo como antes, como sempre. Não dava grande atenção a ninguém que não fizesse parte do dia-a-dia imediato, mas não era falta de Amor. Simplesmente não sentia a falta de ninguém. Nem mesmo das pessoas mais óbvias. Declarava essa falta, na verdade, mas não a sentia. E não era de propósito, era um desprendimento de quem não quer sofrer, pensava. Não pertencia a lado nenhum porque os laços que criava podiam até ser intensos num primeiro momento, mas acabavam por enfraquecer, talvez devido aos seus próprios desaparecimentos. Ligava-se demais às rotinas que encontrava em cada sítio para onde ia, mas facilmente se desprendia. A vida sem âncoras onde voltar não deixa de ser uma vida solitária. E ninguém quer estar sozinho. Bem, pode ser que haja quem queira, Talvez quisesse, mas na verdade não o sabia. Na verdade não o sabia. A vida tinha sido fácil, nunca verdadeiramente perdera ninguém, mas não se dava, não se ligava. Sempre acreditara que sim, via-se como uma pessoa com muito para dar, via-se com alguém para a vida inteira, acreditava que se apaixonava com a maior das facilidades, mas a idade mostrou-lhe que não. E sentia falta desse vazio de quem sofre ou perde por Amor, mas que é um vazio preenchido pelo que sente. Durante meses orgulhou-se da incapacidade de amar. Chamava-lhe antes Controlo sobre o Amor. Mas com o tempo percebeu que não. Incapacidade de amar. E com o frio deixou de ter piada, deixou de ser um controlo de si aprendido numa noite gélida de Junho, com alguém desconhecido, passou a ser um deficit. Não chorava, já não sabia chorar. Não tinha razões para chorar porque não sofria. Sofria de vazio. Quando o vazio é um problema, é porque chegou a altura de chorar, de ter razões para chorar. Não se envolvia, não se empenhava em nada, não dava de si à mais simples das causas, não se entregava nem a si. Nem àquilo em que sempre acreditara. Não se empenhava no futuro, não acreditava no futuro.
E a sua palavra mais recorrente era Não.
1 comentário:
Verinha...
Feliz Natal
Beijinhos
Susana B.
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